sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Porta-retrato

- Analice Ról

Ao andar por esquinas, tropecei em pessoas
E de relance imaginei teu rosto e teu andar
O que faria se te encontrasse ali, sem motivos
Algo impossível, talvez

Não respondi. Não sei se choraria ou riria do absurdo
Sei que seria surpresa. Sua presença me intimidaria
Deixaria de ser eu, ali, no meio da rua.

Imagino que o homem que me assedia com os olhos
No ponto do ônibus, está mais próximo à mim do que você
E que atendentes de lanchonetes, lavadores de carro,
pássaros sem ninho devam fazer parte de tua rotina
E eu aqui, a esquecer teu rosto

O amor que talvez sentisse, não fosse mais amor
Fosse um calor momentâneo, que hoje lembra-me nossas noites
Nosso sexo, nas manhãs quando dava-me um beijo e já partia

Talvez fosse uma dor ou uma falta que preenchia com teus abraços
Achava que ao teu lado estaria protegida de mim e de tudo
Não estava. Sofri mais. Chorei.

Ali, naquelas esquinas tumultuadas, vi um homem fumando
Imaginei que se eu tivesse um vício assim: cigarro ou bebida
Amaria mais o meu vício do que a ti
Foi então que acendi um cigarro
E a imagem de um avô que não conheci
Era mais nítida do que teu rosto no porta-retrato.

[8 dias]