segunda-feira, 30 de março de 2009

IV

– Analice Alves

Feri meu corpo
Com o pior dos açoites
Amo, não nego
Amo como a noite
Que desiste de ver o dia
E dorme...

Se um dia perguntarem
Por onde ando
Não responda
Fique mudo
Coloque a mão
Em seu coração

Lá habitei por anos
Percorri esquinas
E me perdi de mim
Encontrei um tempo
Diferente deste que vivemos
Alimentei-me de amor

Feri meu corpo
Com o pior dos orgulhos
O desamor não é vaidade
É vantagem de gente mesquinha
Que desiste da vida
E morre...

Se um dia me perguntarem
Por onde andas
Não responderei
Ficarei muda
Porque, de fato, não sei.

(30/03/09)

terça-feira, 24 de março de 2009

Traços do tempo

– Analice Alves

Um sujeito vestido de preto
Em pleno carnaval
Passa a ser impuro
Por deixar de ser ele

Olha-se no espelho
Abre a boca num bocejo
Ajeita o cabelo
Traços do nosso tempo

Por não gostar de mistura
Pede um cow-boy:
Exceto as mãos dela
Unidas às suas

O mundo atual o corrói
Mas nada que doa tanto
Respira fundo, lava o rosto
Está pronto

Um sujeito vestido de branco
Em pleno enterro
Passa a ser impuro
Pois mostra uma insegurança tênue
De seu próprio viver

Não é solução nem problema
Não é vírgula e nem ponto
Não há liberdade
Está preso ao corpo da amada

Como a palavra na garganta
Como ao nome que desconhece

Se, pelo menos, soubesse
Como se chama a sua amada
Daria pra procurar na lista telefônica
Ou fazer uma simpatia
Com seus nomes numa flor amarela

Mas não sabe como se chama
Não sabe sua identidade
Não possui um cartão pessoal
Com seus serviços e telefones

Tem apenas olhos para vê-la
Coração para senti-la
Palavras para lhe dizer “bom dia”

Olha-se no espelho
Passa a mão na barba
Vê as horas no relógio público
Traços do nosso tempo

O amor o corrói
Mas nada que doa tanto
Respira fundo, chora um pouco
Mas não está pronto...

(24/03/2009)

terça-feira, 17 de março de 2009

Poesia é complicação

"Poesia é complicação. É doença da linguagem. (...)" (Ruy Bello)

Por que?
(pensem nisso)


Reticentimentos - Analice Alves

quando leio um poema
e ele nada me diz
eu des-sinto
é uma morte pequena
porém pior do que morte matada
é suicídio poético

o poeta que escreve
encantamentos numa folha de papel
coitado! nao entende o seu poema
este já não é mais seu
nem meu
é de tudo e de todos

o poeta que escreve
abobrinhas ou caviar
é um poeta, certamente
mas mente como um ator
como Pessoa, como gente.

o poeta que acha
que entende tudo
não passa de farsante
não entende porra nenhuma
nem mesmo as sobras da sobra

o poeta que finge
ah, esse sim é grande
mas mesmo assim
não alcança a totalidade
de sua obra...


17/03/09

terça-feira, 10 de março de 2009

comida é pasto

1. Para que poetas em tempos de fome?

- A poesia sempre foi vista como algo secundário. A fome, a violência, a realidade social em que vivemos sempre foram muito mais importantes e herméticas do que um poema parnasiano. A pergunta acima tem mais de 200 anos e participa de nosso presente. Afinal, quando foi que não vivemos tempos de fome? Sempre esbarramos na mesma problemática. A Literatura sempre sobreviveu aos tempos (de fome), porque também existe a fome de cultura, a sede de informação, o tesão por livros e conhecimento. Poetas e poesias em tempos de realidade escancarada são válvulas de escape, são plataformas para o sonho. A poesia pode ser um mundo particular, porém a Literatura tem sua função acima de tudo, tem seu lugar no real e não apenas no imaginário, tem seu espaço na consciência social e nos punhos de um poeta revolucionário. Poetas são vistos como vagabundos ou menos importantes do que engenheiros, por exemplo. Cada um tem sua importância e, em tempos de fome, todos são influenciados pelo mesmo mal. O poeta, no entanto, é o capaz de praticar a paralaxe, de enxergar o problema em diferentes pontos de vista, de colocar o objeto de estudo (a fome, por exemplo) num ângulo onde todos possam entendê-lo com maior clareza.

Poema - Analice Alves

Olho para o futuro com louvor
É uma caixinha de bombom
E por mais que saibamos o sabor
Não sabemos se dentro dele
Haverá licor.

sábado, 7 de março de 2009

Meu iaiá, meu ioiô...

Poema em si - Analice Alves

Queremos encontrar a felicidade
Mas não calçamos os sapatos
Queremos a vitória
Mas estamos de chinelos


Museu I - Analice Alves

Sinto raiva de tudo isso
Te amar é muito mais que prejuízo
Gasto lenços, perco o juízo

Museu II - Analice Alves

Bebo a vida pelas beiradas
Vai que aparece uma mosca no copo!
Engolir jamais, quero mais ócio

Saudade fez samba - Analice Alves

Sei porque voce se foi
Sem nem me deixar bilhete ou carta
Agora quero que se exploda o teu coração
Meu samba não tem cordão.

Você é luz - Analice Alves

Você é meu sol
Minha lua, meu Rio
de Janeiro, meu enredo
Meu rascunho e minha obra
Você é meu amor
è meu suor, minha cura
e minha cólera